O Ministério da Fazenda anunciou na última quinta-feira (12/01/2023) uma série de medidas alegando ter com o objetivo de aumentar a arrecadação e diminuir o déficit fiscal.
O pacote econômico previu modificações importantes no âmbito do processo administrativo fiscal federal, o que chamou de “incentivo à redução da litigiosidade no Carf”.
Dentre as modificações esta o fim do desempate pró-contribuinte e o retorno do voto de qualidade nos julgamentos realizados pelo Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais). Por meio dessa sistemática, havendo empate nos votos dos conselheiros do Conselho, caberá ao presidente da Turma decidir a controvérsia através do voto de qualidade (art. 5º da Medida Provisória nº 1.160/2023).
Historicamente o voto de qualidade foi incluído no § 9º no art. 25 do Decreto nº 70.235/1972 – que regula o processo administrativo fiscal federal – através da Medida Provisória nº 449/2008 (convertida na Lei nº 11.941/2009). Posteriormente, por meio da Medida Provisória nº 899/2019 (convertida na Lei nº 13.988/2020), extinguiu-se o voto de qualidade (art. 28) para aplicar o desempate pró-contribuinte, isto é, a aplicação do entendimento favorável ao contribuinte.
Segundo o Ministério da Fazenda, a medida é uma alternativa mais branda à orientação do Tribunal de Contas da União (TCU) de extinguir a paridade no Carf (isto é, extinguir a representação em igual quantidade de “conselheiros do Fisco” e “conselheiros dos contribuintes”). O objetivo do retorno do voto de qualidade seria impedir que o Fisco ficasse prejudicado em todas as situações de empate, mesmo quando existam teses judiciais favoráveis à Fazenda.
O fato é que o retorno do voto de qualidade trouxe de volta o voto “duplo” da Fazenda na medida em que apenas um representante da Fazenda Nacional pode ocupar a presidência da Turma. Ademais, a apresentação do voto de qualidade como medida integrante de um plano de recuperação fiscal equiparou o Conselho a um órgão arrecadatório e não de controle de legalidade dos lançamentos tributários.
A própria divergência entre os conselheiros revela a controvérsia sobre a interpretação da legislação tributária. Nesse sentido, o retorno do voto de qualidade apenas irá postergar a decisão para o Poder Judiciário.
Além do voto de qualidade, a Medida Provisória nº 1.160/2023 (art. 4º) também tratou sobre o julgamento em definitivo pelas Delegacias de Julgamento (DRJs) para os processos com valores abaixo de mil salários mínimos, o que antes era restrito aos processos com valores de até sessenta salários mínimos. Segundo o Ministério da Fazenda, tal medida reduzirá 70% dos processos que chegam ao Carf. No ano de 2023, isso significa que todos os processos com até R$1.320.000,00 serão julgados apenas na primeira instância administrativa.
Se por um lado a medida torna o processo administrativo mais célere, por outro incontestavelmente cerceia o direito de defesa do contribuinte em importante fase da discussão do débito. Isso porque durante todo o processo administrativo o crédito tributário permanece com a exigibilidade suspensa, isto é, o Fisco fica impedido de cobrar a dívida. Tal situação não ocorre no processo judicial, quando a suspensão fica vinculada ao depósito integral e em dinheiro do montante devido ou a concessão de tutela de provisória/medida liminar (art. 151 do Código Tributário Nacional).
Outra modificação anunciada pelo Ministério da Fazenda, publicada pela Portaria MF nº 2/2023, é o fim do Recurso de Ofício para os decisões que exonerem os sujeitos passivos do pagamento de tributos e multa em valores abaixo de quinze milhões, o que, segundo o Ministério, acarretará a extinção automática de quase mil processos em trâmite no Carf.
Por fim, os representantes do governo trataram sobre a possibilidade da Procuradoria da Fazenda judicializar demandas administrativas em que a Fazenda é vencida. Ora, se é o próprio Órgão Administrativo, exercendo o seu poder/dever de controle interno de legalidade dos lançamentos tributários, em processo marcado pela dialética, ampla defesa e contraditório, quem decide anular o débito; se é o próprio credor quem reconhece ser o débito indevido; extinta está a obrigação tributária em seu âmago e, consequentemente, carece de interesse de agir eventual demanda judicial.